Bonde moderno em túnel do tempo do Império
08/07/2012 - O Globo, Isabela Bastos
VLT da Zona Portuária começa a circular na Copa, com linhas cortando áreas totalmente revitalizadas do Centro.
Um velho túnel ferroviário, construído ainda no Império e há décadas abandonado, começa a tomar nova forma sob o Morro da Providência. Escavado no século XIX, para dar passagem ao transporte de cargas entre o Porto do Rio e a Estrada de Ferro Dom Pedro II (atual Central do Brasil), o túnel de 315 metros está sendo ampliado para receber bondes modernos, que deverão fazer parte da paisagem da Zona Portuária até 2016. O sistema de veículos leves sobre trilhos (VLTs) é uma das obras previstas na esteira do projeto Porto Maravilha, de revitalização da região. Do pacote também fazem parte novos túneis e avenidas, a demolição do Elevado da Perimetral, a reestruturação de redes subterrâneas de serviços públicos, a construção de museus e a recuperação de bens históricos. Parte dessa revitalização já está pronta e leva colorido à Avenida Barão de Teffé e seu entorno, onde escavações revelaram parte da história do tráfico negreiro no Rio.
Com seis linhas e 42 estações, o VLT deverá entrar em pleno funcionamento no primeiro semestre de 2016. Pelo cronograma da Companhia de Desenvolvimento Urbano do Porto (Cdurp), contudo, duas linhas começam a operar já na Copa de 2014. Uma delas deverá passar pelo túnel ferroviário. O projeto será apresentado em audiência pública amanhã, às 10h, na prefeitura. Já a concorrência para escolha do consórcio que vai implantar e operar o sistema por 25 anos deverá ocorrer em 30 dias. A previsão é que o vencedor saia em outubro e as obras comecem em janeiro de 2013.
Túnel deve ficar pronto até julho de 2013
Orçado em R$ 1,1 bilhão, o VLT será financiado em parte pela União, que aplicará R$ 532 milhões na obra. Segundo o presidente da Cdurp, Jorge Arraes, o edital deverá prever que o consórcio adiante o restante dos recursos e só comece a receber a contraprestação da prefeitura depois que as duas primeiras linhas começarem a operar.
- O investimento inicial em material rodante e carros será pago pelo operador. Os custos operacionais do VLT e os lucros virão da bilhetagem - explica.
A engenharia financeira que dará viabilidade econômica ao projeto ainda está sendo finalizada. Mas já está decidido que os passageiros do VLT poderão usar o bilhete único no sistema. A validação dos bilhetes acontecerá nos vagões e nas estações de embarque, que não terão bilheteiros. Fiscais percorrerão as linhas para cobrar o pagamento da passagem. O sistema deverá ter ainda a tecnologia como aliada para evitar eventuais calotes. Sensores poderão fazer a validação automática da passagem mesmo que o bilhete esteja dentro de bolsas ou de peças de vestuário dos passageiros.
Uma das duas linhas a ficarem prontas em 2014 cortará a Zona Portuária, ligando a Rodoviária Novo Rio à Avenida Presidente Antônio Carlos, no Centro, passando pelas avenidas Rodrigues Alves e Rio Branco. Já o segundo circuito fará a ligação da Central do Brasil à Praça Mauá, passando pelo túnel ferroviário e contornando a Cidade do Samba.
De acordo com a concessionária Porto Novo, que assumiu em 2011 as obras de revitalização, o túnel ferroviário deverá ficar pronto até julho de 2013. O consórcio terá que deixar preparada ainda a calha de passagem do VLT nas vias públicas que estarão ou já estão em obras.
Redes de água e esgoto serão redimensionadas
A implantação do VLT é uma das faces da revitalização que, entre obras e serviços públicos, deverá ter investimentos de R$ 8 bilhões nos próximos 15 anos. O projeto prevê o desmonte gradual do Elevado da Perimetral a partir de abril de 2013; a reestruturação das redes de água, esgoto, drenagem, gás, telefonia, energia elétrica e iluminação pública de uma região de cinco milhões de metros quadrados; a construção do Museu do Amanhã, cujos primeiros pilares começam a aparecer no Píer Mauá; um reservatório de água no Morro do Pinto; três unidades de tratamento para os rios Comprido, Papa Couve e Maracanã; e o aumento de três para 11 do número de galerias de escoamento de águas pluviais.
O pacote inclui ainda a Avenida Binário, que está sendo construída em paralelo à Avenida Rodrigues Alves, terá dois túneis (sob os morros da Saúde e de São Bento) e duas alças de ligação com o Elevado do Gasômetro. Outra intervenção programada é a transformação da Rodrigues Alves numa via expressa, que terá parte de seu trajeto num túnel. Segundo o diretor-presidente da Porto Novo, José Renato Ponte, dois poços de perfuração desse túnel estão sendo montados na Praça Barão de Ladário, no 1 Distrito Naval e num terreno da Rua Sacadura Cabral.
- Nesses poços, o primeiro trabalho será o de arqueologia. As escavações no Porto têm revelado muitos vestígios históricos - diz José Renato.
Alguns desses vestígios foram expostos pelas obras da primeira fase do Porto Maravilha, iniciada em 2009 com recursos municipais. Num investimento de R$ 139 milhões, foram reurbanizadas 24 vias dos bairros de Saúde, Gamboa e do Morro da Conceição, entre elas as avenidas Barão de Teffé e Venezuela e as ruas Camerino e Sacadura Cabral. Na Barão de Teffé, as escavações para a implantação de tubulações de serviços públicos trouxeram à luz o antigo Cais do Valongo, por onde desembarcavam os escravos durante o Império. A localização do cais determinou mudanças no projeto, para que o sítio arqueológico virasse um memorial aberto à visitação.
Perto dali, as obras restauraram ainda os Jardins do Valongo. Construído em 1906 pelo então prefeito Pereira Passos, o conjunto arquitetônico inclui um antigo mictório público e a Casa da Guarda, que será transformada em centro cultural. O jardim recebeu de volta ainda as estátuas dos deuses Minerva, Mercúrio, Ceres e Marte, retiradas pela prefeitura da região em 2002, por causa de vandalismo.
O jardim só será aberto à visitação no dia 24 deste mês. Mas muita gente já vem descobrindo que o cais, a praça com canteiros de flores, as ruas do entorno e seu casario carregado de história valem o passeio. O trabalho ainda não acabou. Há canteiros aqui e ali, como no Largo da Prainha. Mas o baticum das máquinas não calou o samba das segundas-feiras na Pedra do Sal.
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