segunda-feira, 27 de julho de 2015

Bondes voltam aos trilhos em Santa Teresa

27/07/2015 - O Globo

Quase quatro anos após o acidente que tirou os bondes dos trilhos de Santa Teresa, o sistema volta a operar hoje, mas apenas num trecho de 1,7 quilômetro. Duas composições vão circular entre os largos da Carioca e do Curvelo, a cada 20 minutos, das 11h às 16h, de segunda a sábado. Nesta fase inicial, a passagem será gratuita. Um cartão- postal da cidade voltará, enfim, a fazer parte da paisagem.

O bondinho de Santa Teresa começa a circular hoje sobre os Arcos da Lapa, quase quatro anos após interromper a operação devido ao acidente que deixou seis mortos e 57 feridos. Mas será um aperitivo: entrará em uso apenas 1,7 dos 10,5 quilômetros de trilhos que estão sendo implantados no bairro. Além disso, o sistema só vai funcionar de segunda a sábado, das 11h às 16h, com capacidade máxima de 32 passageiros por veículo. Chegar ao Silvestre, última estação, ainda levará tempo. O governador Luiz Fernando Pezão avisou, na semana passada, que a obra só termina em 2017. A previsão inicial era que tudo estivesse pronto há um ano. Neste primeiro momento, dois bondes vão circular no trecho que vai do Largo da Carioca até o Largo do Curvelo.

Quem quiser matar a saudade de andar nos estribos também não vai conseguir. No novo modelo de bonde, eles são retráteis e só abrem nas paradas. Além disso, também não serão permitidas viagens em pé. Segundo o secretário estadual de Transportes, Carlos Roberto Osorio, a operação de hoje é, na prática, uma reintrodução do bonde no cenário e no cotidiano do bairro. E esse retorno será feito de forma gradual.

— Terminamos os testes e decidimos começar a pré- operação nesta segunda ( hoje), cumprindo o prazo de voltar a operar um dos trechos até o fim de julho. No período inicial, em cada carro vamos ter, além do motorneiro, um agente, que ficará responsável por dar informações aos usuários na hora da partida, e durante a viagem vai indicar os pontos. Também teremos agentes de trânsito ao longo dos trilhos, numa ação educativa. As pessoas precisam lembrar que não é permitido estacionar por lá — explicou Osorio.

VIAGENS SERÃO GRATUITAS

Segundo o secretário, na primeira semana dois bondes vão operar com intervalos de 20 minutos, e não haverá cobrança de passagem. O embarque e o desembarque serão feitos exclusivamente nos pontos de parada. E, caso haja demanda, o tempo de intervalo entre os bondinhos poderá ser reduzido.

— Vamos avaliar isso e conversar com os moradores. Só começaremos com dois bondes, que vão sair simultaneamente do Largo do Curvelo e do Largo da Carioca, a cada 20 minutos. Mas, como temos quatro bondes aptos a entrar em operação, poderemos fazer adaptações — disse Osorio.

Ao todo, 12 agentes da Secretaria de Transportes estarão nas estações do Largo do Curvelo e do Largo da Carioca para orientar os passageiros. Na última sexta- feira, o órgão instalou novas placas indicando os pontos de parada dos bondes ao longo da Rua Joaquim Murtinho e outras ruas. De acordo com Osorio, os locais de parada dos antigos carros foram respeitados. Ainda segundo o secretário, ficou combinado com os moradores que, se houver necessidade, os pontos de embarque e desembarque poderão ser modificados.

Os moradores do bairro comemoram o começo da volta do bondinho, mas acompanham o processo com precaução, já que o consórcio ElmoAzvi, que executa as obras, não vinha respeitando o cronograma. O consórcio foi multado duas vezes por problemas nos serviços prestados. O montante chega a R$ 1,35 milhão. O grupo apresentou recursos, que estão sendo analisados.

— Para nós, o fato de o bonde voltar a operar num trecho é bastante positivo. Esperamos que, de agora em diante, os prazos sejam respeitados, que as obras no Largo dos Guimarães sejam logo concluídas, e os trabalhos avancem em direção ao Largo das Neves e ao Silvestre — comentou Sergio Teixeira, um dos diretores da Associação de Moradores de Santa Teresa ( Amast).

O comerciante Maurício Gilson reclama que as obras têm feito seu faturamento cair:

— Temos a loja de Santa Teresa há mais de quatro anos, quando o bonde ainda circulava. Sem ele, perdemos 80% das vendas. Esperamos que o bonde retorne e traga de volta o povo da área cultural.

OUTRO TRECHO SERÁ REATIVADO EM OUTUBRO

Osorio afirma que o trecho dos trilhos da Rua Almirante Alexandrino ao Largo dos Guimarães deve entrar em pré- operação a partir de outubro:

— A obra física até o Largo dos Guimarães será concluída até o fim de setembro. Em outubro, começam os testes nos trilhos e poderemos iniciar a pré- operação nesse trecho. Em seguida, a obra vai continuar em direção ao Silvestre.

Outro problema também preocupa: o custo da obra, que está 49% mais alto que o valor inicial — era R$ 58,6 milhões, em junho de 2013, e passou para R$ 87,1 milhões. Até agora, o governo estadual pagou R$ 43,5 milhões, o equivalente à metade do atual orçamento. Parte da obra, no trecho entre a Carioca e o Curvelo, precisou ser refeita, porque houve um erro na instalação do rejunte dos trilhos com os paralelepípedos, que ficaram numa altura inadequada, impedindo o acionamento do freio magnético dos veículos. A lentidão das obras em Santa Teresa afetou a fabricação de 14 bondes encomendados pelo estado, por R$ 40 milhões, em 2012. Apenas cinco veículos foram entregues pela TTrans. O governo determinou a paralisação da produção para evitar o risco de a nova frota se deteriorar.

Comerciantes do bairro amargam prejuízos por causa das obras intermináveis. Pela estimativa da Associação de Amigos e Empreendedores do bairro ( Ame Santa, que reúne 25 empresários), as perdas no faturamento se mantêm perto dos 40%. Em maio, a queda de movimento chegou a 60%.

O acidente com o bonde aconteceu na Rua Joaquim Murtinho, em 27 de agosto de 2011. Na época, o então governador Sérgio Cabral admitiu que o sistema estava sucateado e mal gerido, e interrompeu o serviço. Em novembro de 2013, o estado anunciou o início de obras. Na ocasião, prometeu que, ao longo de 2014, os bondes estariam de volta.

Ateliês abrem as portas

Apesar de transtornos, evento reúne 40 mil pessoas no fim de semana

Santa Teresa sempre foi um canteiro de obras de arte. E os 25 ateliês do bairro montaram exposições este fim de semana, durante a 25 ª edição do Arte de Portas Abertas, que atraiu 40 mil visitantes. Na avaliação dos organizadores, os buracos, o barulho e a poeira que imperam pelas principais ruas da região não conseguiram ofuscar o sucesso da festa. Ontem à tarde, as vias do bairro ficaram cheias. Ao todo, 66 artistas participaram. Quatorze restaurantes abriram com programação especial.

Alguns participantes, porém, reclamaram da queda no movimento. A artesã Taiane Vilas Boas, do VB Atelier, já participou de cinco eventos e, desta vez, sentiu os efeitos das obras, inclusive nas vendas:

— É ruim, porque Santa Teresa já é um lugar complicado de se chegar. Além de o acesso ficar difícil, a poeira prejudica nossos trabalhos, pois acaba sujando tudo.

A fotógrafa Daniela Rocha, que participou pela terceira vez do evento, planejava expor as suas fotos poéticas na calçada do Cine Santa, no Largo dos Guimarães. Porém, como esta é justamente a parte do bairro em que mais se concentram as obras, ela precisou mudar de lugar e se instalou em uma passagem criada ao lado.

— Coloquei o meu trabalho bem próximo das obras para que ele seja visto como o oposto delas. Uma beleza em meio ao caos. Virou uma intervenção — disse ela.

Para a advogada Renata Pinheiro, que mora na Abolição e esteve no evento pela primeira vez, os taxistas, que já se recusavam a ir até o bairro, ficaram ainda mais arredios depois das obras. Para chegar aos ateliês anteontem, ela precisou subir a pé a Rua Almirante Alexandrino até o Largo dos Guimarães.

Apesar das reclamações e dos transtornos relatados, a artista plástica Regina Marconi, conselheira da Associação Chave Mestra, que organiza o evento, não demonstrou preocupação com os transtornos provocados pelas obras. Bem antes do evento, ela aconselhou os visitantes das exposições a não subirem ao bairro de carro, para evitar congestionamentos, além de acidentes.

— Quando o canteiro estava completamente aberto, com as pedras e dormentes expostos, nós estávamos preocupados. Mas ele foi todo cercado na última sexta- feira, e isso permitiu o caminho livre para os visitantes. Ficamos tranquilos porque o espaço na rua diminuiu, mas a parte que sobrou ficou segura e livre. Antes, obra e rua eram a mesma coisa. Agora, melhorou para os moradores e os visitantes. Mas esperamos que a obra acabe logo.

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