26/05/2014 - UOL
A promessa do Governo do Rio de Janeiro era clara: os bondinhos de Santa Teresa, na região central da capital fluminense, voltariam a circular no bairro em junho deste ano, antes da Copa do Mundo. No entanto, a menos de três semanas da Copa, os canteiros de obras inacabados continuam espalhados pelo bairro, e a previsão de entrega foi atualizada pelo governo estadual para o "início do segundo semestre de 2014". Moradores do bairro dizem não acreditar que os bondes voltarão a circular nem mesmo neste ano.
O sistema de bondes está desativado desde o dia 27 de agosto de 2011, quando um acidente com um dos veículos matou seis pessoas. Dentro de três meses, portanto, o bairro completará três anos sem um dos seus maiores símbolos.
A previsão de que a primeira etapa das obras de reestruturação do sistema estaria pronta antes do início da competição da Fifa, que começa no dia 12 de junho, foi anunciada em novembro do ano passado, quando começaram as intervenções no bairro.
"O que nós mais queremos é que essa obra se encaminhe com rapidez, segurança e qualidade e que o bonde volte a circular. Mas a impressão que nós temos da obra, do que vimos até agora, é que ela sofre de falta de planejamento. Em seis meses, dos 14 mil metros de trilhos do sistema de bondes, foram trocados 1.300", afirmou Jacques Schwarzstein, diretor de Transportes da Amast (Associação de Moradores e Amigos de Santa Teresa). "No ritmo que a obra vai, ela pode durar cinco anos. Se dermos um desconto, no mínimo dois anos e meio."
No anúncio do início das obras, no dia 8 de novembro do ano passado, o subsecretário da Casa Civil, Rodrigo Vieira, afirmou que veículos que circulariam na primeira etapa da obra, de 7,2 km (entre os Arcos da Lapa e a estação Dois Irmãos), começariam a ser testados na ruas em março, quando os trilhos já teriam sido trocados.
Questionado sobre os motivos do atraso, o Governo do Estado limitou-se a informar, em nota enviada pela assessoria de imprensa, que "concessionárias de serviços públicos também estão fazendo a troca dos sistemas de água, gás e drenagem".
Também não foi informado quantos quilômetros de trilhos já foram trocados. Na rua Joaquim Murtinho, que tem 1.200 metros de extensão, apenas um dos sentidos dos trilhos está pronto.
A necessidade de reparos nas antigas redes da Cedae (Companhia Estadual de Águas e Esgotos) e da CEG (Companhia Estadual de Gás) foi apontada como a justificativa para os atrasos e para a falta de um prazo definido para entrega das obras por um engenheiro do consórcio Elmo-Azvi, vencedor de licitação, que estava em Santa Teresa na última quinta (22) e pediu para não ser identificado.
Para o representante da Amast, Jacques Schwarzstein, faltou ao consórcio e ao governo realizar um estudo de terreno e manter um diálogo aberto com a população do bairro. "Santa Teresa não é para principiantes. A gente não quer criar problemas, queremos ajudar", declarou.
"Nós sabemos que esse início dos trabalhos foi complicado, que o trecho é difícil, mas gostaríamos que o governo fosse sincero e aberto conosco e que nos apresentasse um cronograma da obra, nos dissesse o que a população deve esperar", disse Schwarzstein.
O investimento do Governo do Estado para a reestruturação do sistema totaliza R$ 110 milhões e inclui a aquisição de 14 novos bondes (R$ 40 milhões), a troca das redes viária e aérea e da subestação de energia (R$ 60 milhões) e a reforma dos pontos e da oficina dos veículos (R$ 10 milhões).
Transtornos e descrença
Para os moradores de Santa Teresa, os transtornos causados pelas obras desde novembro já eram esperados. Moradora há 20 anos da rua Joaquim Murtinho, onde fica o primeiro trecho a entrar em obras, de 1.200 metros, a historiadora Anete Ferreira reclama, no entanto, do descumprimento do prazo inicial para a conclusão da intervenção no local.
"O nosso maior problema é que a gente nem sabe qual é o prazo. O primeiro que foi prometido para a rua Joaquim Murtinho era de quatro meses. Já entramos no sétimo mês de obra e a metade ainda não ficou pronta", afirmou. "O que nós, moradores, questionamos é a forma de organização dessa obra, o planejamento que não foi feito e a maneira como ela impacta no nosso cotidiano negativamente."
Dono de um albergue localizado na mesma rua, o austríaco Oliver Franklin, que mora na cidade há um ano e nem chegou a ver os bondinhos circulando, acredita que o maior problema é a falta de transparência por parte dos responsáveis pela obra.
"Eu quero que ele [o bondinho] volte rápido. A obra fica na frente do albergue e dá muita poeira, tudo fica sujo, tem barulho. A pior coisa pra mim é que está demorando muito sem que eles avisem de uma forma transparente porque está demorando tanto", declarou Oliver, que vestia uma camisa com a imagem de um bonde com uma lágrima. "Antes de começar, eles deram um cronograma das obras para os moradores, e já era para ter avançado muito mais."
Além dos atrasos, a dificuldade de mobilidade dentro do bairro é outra reclamação frequente dos moradores. "Antes eu sempre pegava o bondinho pra andar por aqui e para ir ao Centro. Agora eu tenho sempre que pegar ônibus e, com essas obras, é muito complicado", disse o estudante Bernardo Janot. "Eles vão abrindo obra aqui e ali embaixo e não terminam nenhuma delas, e vai ficando difícil de passar carro e ônibus."
Até mesmo receber visitas se tornou uma missão difícil em meio aos canteiros de obras. "Tem seis meses que eu não recebo ninguém lá em casa. Se eu quiser ver os amigos, eu que vá, porque está impossível", disse a socióloga Graça Almeida.
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